O Mágico de Oz
“Toto, I´ve a feeling we are not in Kansas anymore”
The Wizard of Oz, 1900
Para explicar um pouco nossa recente visão de Brasil, lembrei do filme “O Mágico de Oz”. Lançado em 1939, o enredo é uma fantasia onde a jovem protagonista (Dorothy) é varrida por um furacão com seu cachorro (Toto) para uma outra dimensão na mágica “Terra de Oz”. Nessa aventura, ela é acompanhada por três personagens principais, cada um com uma agenda: Um homem de lata sem coração, um espantalho sem cérebro, e um leão sem coragem. O enredo é simples: os quatro personagens precisam viajar para encontrar o “Mágico de Oz”, que concederá à cada um, seus desejos, enquanto a “Bruxa Má” é a principal antagonista da aventura.
O livro virou estudo em cadeiras de economia, pelos paralelos que o autor fez com as alegorias do livro: O Mágico de Oz era o presidente americano da época, que concedia desejos, dado seus “superpoderes”, os companheiros de Dorothy eram segmentos da sociedade americana — O homem de lata, o proletariado industrial; o espantalho, os trabalhadores agrícolas e por assim vai.
Mas me pareceu particularmente propício essa alegoria para entender o atual momento do Brasil. Nele, o Eleitor Brasileiro (Dorothy), após um furacão (desarranjo institucional e fiscal provocado pelos governos anteriores), se junta à alguns segmentos da sociedade para chegar ao Mágico de Oz (Presidente da República), seguindo uma estrada de tijolos amarelos (reformas) para terem seus desejos agraciados (pleno emprego e inflação baixa). Mas a Bruxa má (a pandemia, o congresso, a câmara e os inimigos políticos do estado) é implacável e atrasam a jornada. Após uma série de desventuras, percebem que o Mágico de Oz não faz milagres (a decepção com a capacidade de Guedes entregar resultados). No final do filme, após entregar penduricalhos alegóricos que representam as difíceis escolhas que os aventureiros tiveram que tomar para chegar aonde queriam (a jornada é que importa e não o destino), o Mágico de Oz, agora desvendado como uma pessoa comum, leva Dorothy de volta à sua cidade natal (o mesmo ponto onde começamos a jornada).
Mas como essa narrativa se encaixa tão bem à nossa atual realidade? Porque o Mágico de Oz é uma crítica velada ao populismo ou a personificação da resolução dos problemas nacionais, na figura de uma pessoa em detrimento das instituições. O Brasil sofre cronicamente dessa narrativa, ao escolher em não fortalecer as suas principais instituições década após década (com notáveis exceções, entre elas a política monetária). Começamos com o termo presidencial de Bolsonaro com olhos na terra prometida: reformas do sistema tributário, administrativo, previdenciário e o tamanho do estado da economia. Já na segunda metade do mandato, a pandemia e suas bruxas “avacalharam” o fiscal (praticamente consumiram 60% da austeridade da reforma da previdência);
O presidente ensaia movimentos populistas com empresas de capital aberto (a interferência na Petrobrás); a equipe econômica praticamente desmontada com Guedes subnutrido no governo; e com o comando da câmara e o senado com inclinações populistas (retomada do auxílio emergencial). A volta de Lula no cenário político só deixa mais fantasioso esse desejo neoliberal, com a possibilidade real do Brasil voltar a ser guiado pelo prisma de centro esquerda e, abandonar de vez o projeto de modernizar-se economicamente no médio prazo.
Voltando à nossa discussão inicial, a percepção dessa narrativa do “copo meio vazio” formou-se em questão de semanas em 2021. Em menos de um mês, o executivo se alinhou com o legislativo e trouxeram à tona novas rodadas de auxílio emergencial; também se constatou que, muito provavelmente, o Brasil estoura o teto de gastos oficial de 2021; o próprio Guedes mencionou sua saída caso não consiga “segurar o fiscal”; e a eleição de 2022 foi deflagrada muito antes do que se esperava com um forte (e talvez favorito) candidato de esquerda.
Tudo isso fez com que curva longa no Brasil inclinasse 150 pontos no ano, e com inflação claramente incomodando, um ciclo de alta de SELIC de cerca de 300 pontos se formasse. A tese mais queridinha do mercado, de SELIC a 2% por longo tempo e os juros longos baixos, a gasolina do mercado de renda variável, desmontou-se rapidamente. O upside do nosso preço alvo de Ibovespa caiu 15% em 5 semanas, com o aumento dos juros longos, que hoje já estão a 8.50% contra uma SELIC de 2%.
Poucas dinâmicas são tão frustrantes na profissão de investidores quanto uma mudança brusca de cenário. A razão disso é que os profissionais desse mercado — nós, gestores — raramente podem antecipar certos acontecimentos de “força maior”. A pandemia da COVID-19 foi um exemplo disso. Não há gestor que possuía a tese de investimento do colapso econômico mundial proveniente de uma pandemia. Entretanto, para os brasileiros que achavam que 2021 seria um ano mais tranquilo desse ponto de vista, até o começo de março essa tese está se provando o contrário.
Alegorias à parte, o cenário no Brasil mudou radicalmente, em pouquíssimo tempo. A possibilidade de Lula participar das eleições em 2022, gera um prêmio de risco incalculável para os juros futuros — não necessariamente negativo, mas a futura política econômica de um terceiro governo Lula, que assumiria o país com uma dívida bruta com relação ao PIB de mais de 90%, é completamente imprevisível. Faria Lula um aceno ao mercado financeiro e às reformas? Como seria o cuidado fiscal de Bolsonaro num ano de eleição e com seu capital político minado? O risco parece que, pela direita ou pela esquerda, uma narrativa populista poderia se concretizar. Se alguém leu ou viu recentemente o Mágico de Oz, sabemos que as promessas populistas não entregam os desejos macroeconômicos de longo prazo do eleitorado — e não somente nos romances.
Alex Lima e Josian Teixeira
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