Crise de confiança: O que as contas externas nos dizem?

Para concluir a nossa série de conteúdos relacionados à atual crise de confiança (Desvalorização da Moeda, Desajuste Fiscal e Os Impactos Sobre a Inflação e O Que Os Dados Mostram), iremos avaliar como andam os fundamentos do nosso balanço de pagamentos. Através dele, podemos averiguar a capacidade do país honrar seus compromissos externos, o pagamentos de dívida em dólares e as importações de bens e serviços. Esta avaliação é crucial para entender o potencial de desvalorização adicional da moeda brasileira.
Vale lembrar que ao longo da nossa história o Brasil enfrentou, por diversas vezes, problemas nesta seara. Usaremos esses momentos em que a vulnerabilidade externa se exacerbou como baliza para a comparação com a crise atual. Mais especificamente, tomaremos como base o comportamento das variáveis em dois episódios recentes:
1) A crise de confiança em 2002, quando o mercado se mostrou receoso em relação às políticas econômicas que seriam adotadas no caso da troca de poder (o que não se confirmou),ao mesmo tempo em que o país se recuperava da crise da dívida pública de países emergentes e
2) A crise de 2014/15 quando o país vivia uma crise fiscal acompanhada da iminência de um impeachment e do início de uma recessão econômica, levando à perda do grau de investimento e recuo no fluxo de capital internacional.
Começaremos a nossa análise pelas transações correntes, resultado líquido da balança comercial de bens e serviços e das remessas de rendas. O dado acumulado em 12 meses em percentual do PIB ao final de 2002 estava negativo em 1,85%. Em 2014, o número havia piorado para -4,5% em 2014 e -3,5% em 2015. Ao final de 2024 (no dado de novembro, o último disponível), o dado havia voltado para -2,4%, em linha com a média desde 2020, mas em tendência de piora moderada.
Por outro lado, as fontes de financiamento estão em patamar mais elevado em relação aos períodos anteriores.
A soma, calcada principalmente nos investimentos diretos e dos investimentos em carteira, chegaram a quase USD 70 bilhões ao final de 2024, acima dos USD 39 bilhões de 2015 e dos USD 22 bilhões de 2002.
Por fim, o nível de reservas (em USD milhões) está em patamar similar a 2015 e bem acima de 2002. O dado ponderado pelo total de importações, uma forma de relativizar as reservas em relação a necessidade de pagamento de compras, o patamar também está melhor que 2002, mas abaixo do que foi registrado em 2015. Ainda assim, o resultado é saudável com o total de reservas acima de um ano de importações.
Os dados nos mostram, portanto que o Brasil possui uma posição confortável das contas externas. Além disso, a oscilação da taxa de câmbio não tem impacto na dinâmica das contas públicas, uma vez que o governo não é mais devedor líquido em moeda estrangeira.
Todo esse conjunto de fatores nos coloca em uma situação favorável em relação aos fundamentos. Apesar de vislumbrarmos um processo de deterioração das contas externas nos últimos meses, é nítido que não caminhamos para uma crise no balanço de pagamentos. A solidez da nossa balança comercial e dos investimentos diretos no país oferecem uma ampla capacidade de absorção de choques. Sendo assim, a recente saída maciça de dólares, que levou à forte desvalorização do real, se deu por conta de uma crise de confiança e não como uma crise de fundamentos ou piora da vulnerabilidade externa.
Apesar disso, é preciso cautela. A manutenção de um ambiente de incertezas exacerbadas por muito tempo pode causar a deterioração da conjuntura doméstica.
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