A Incerteza Fiscal, O Prêmio De Risco E A Taxa De Câmbio
Por Marcela Kawauti – Economista-chefe da Lifetime Asset Management
Dois assuntos foram destaque ao longo dos últimos dias: as incertezas em relação às contas públicas e a desvalorização do real brasileiro. Os assuntos têm conexões relevantes que estão além do fato de ocuparem o noticiário econômico. Eles estão altamente relacionados.
A preocupação com orçamento federal não é algo recente. A expectativa de medidas que indicassem compromisso com o novo arcabouço fiscal remonta ao início do ano, especialmente no que tange as ações pretendidas para se atingir o equilíbrio e posterior superávit primário. Mas a demora na divulgação de medidas concretas adiciona stress e incerteza, ainda mais quando as notícias sugerem um ajuste de gastos menor que o necessário.
Em meados de outubro, algumas fontes do governo federal indicaram aos órgãos de imprensa que um pacote de redução do orçamento público seria apresentado após as eleições municipais. Nada foi divulgado, no entanto, e a frustração das expectativas aumentou a gama de incertezas e gerou efeitos sobre a credibilidade institucional do país. De maneira simplificada, o “não ajuste” afugenta o investidor. O impacto sobre os ativos foi bastante relevante. Na renda fixa, as taxas de juros futuras ultrapassaram os 13,0% (a.a.) nos vértices de médio prazo e os juros reais oferecidos pelos títulos públicos acima do IPCA romperam a barreira dos 7,0%. – vide imagem acima.
Mas foi o impacto sobre o dólar que dominou as manchetes. O fluxo de saída de capitais internacionais gera queda da demanda pela moeda brasileira, causando a desvalorização do câmbio. A taxa começou outubro cotada a R$ 5,45/USD e, no último pregão de novembro, superou os R$ 5,80/USD ( um avanço de mais de 6,0% em um mês).
Parte do movimento de valorização do dólar pode ser atribuído a fatores externos como a maior aversão ao risco (impulsionada pela incerteza que cerca a eleição presidencial americana e às tensões no Oriente Médio) e ao lento ajuste de política monetária no Estados Unidos. Mas os dados mostram que as questões internas, em especial a necessidade de ajuste do orçamento público, intensificaram esse movimento. A desvalorização da moeda brasileira se aproxima dos 20% em 2024, enquanto a média das moedas emergentes é de 7%. A variação entre o início de outubro e o começo de novembro foi de 6,5% e 2,1% respectivamente. Nossas estimativas indicam que, expurgado os riscos em relação à política econômica, a taxa de câmbio estaria entre 30 e 40 centavos menor.
Para os próximos meses, os números sugerem que o risco fiscal ainda deve pesar sobre os ativos, com impactos importantes sobre o prêmio de risco, a taxa de câmbio, a inflação ao consumidor e a necessidade de alta de juros. Por outro lado, um eventual anúncio de medidas estruturais relevantes teria impacto positivo sobre o risco fiscal, com potencial de melhora de expectativas, valorização da moeda brasileira e dos demais ativos de risco domésticos.