Dólar blue é cotado a mais de 1 mil pesos na Argentina pela primeira vez

O dólar blue, cotação paralela para a moeda norte-americana amplamente utilizada na argentina, ultrapassou pela primeira vez o valor de 1 mil pesos argentinos. A notícia se dá em meio à crise inflacionária que acomete a Argentina há anos, mas que se agravou a partir de meados de 2022, quando o dólar blue era cotado a cerca de 214 pesos argentinos.
Na cotação oficial, o dólar vale cerca de 360 pesos, mas é preciso ter em mente que a Argentina não utiliza o regime de câmbio flutuante, como o Brasil, no qual o preço das moedas é determinado pelo mercado. Ao contrário, o governo impõe rígidos controles ao valor das moedas estrangeiras, fazendo com que a cotação oficial pouco importe para a população.
O governo argentino adota um sistema de restrições à compra e venda de dólares, limitando a compra de dólares por pessoas físicas a US$ 200 por mês. Essa restrição provocou o surgimento de uma série de cotações alternativas para a moeda dos Estados Unidos, sendo a taxa de referência no mercado paralelo o dólar blue.
Por que o dólar chegou a 1 mil pesos?
Entre 1991 e 2003, vigorava na Argentina a Lei da Convertibilidade, que garantia a paridade entre o peso argentino e o dólar. A medida foi adotada para conter a hiperinflação que assolou o país na década anterior, mas demandava que as autoridades monetárias argentinas garantissem cada peso em circulação com um dólar americano.
No início, a medida freou a inflação e trouxe uma sensação de estabilidade para o país, mas se provou insustentável no longo prazo, uma vez que era praticamente impossível manter um vigoroso fluxo de dólares em direção à Argentina, principalmente em meio aos fenômenos externos que deram força ao dólar a partir de meados dos anos 90.
Na tentativa de manter a paridade entre peso e dólar, a Argentina mergulhou em uma profunda crise econômica entre o final dos anos 1990 e o início dos anos 2000, e teve que abandonar a Lei da Convertibilidade em 2003. Nos anos seguintes, a economia foi impulsionada pelo crescimento chinês e pela valorização das commodities no mercado internacional, mas o fôlego que manteve a Argentina relativamente estável durou apenas até 2011.
Desde então, Argentina tem apresentado graves problemas fiscais, sendo incapaz de pagar por suas dívidas, o que força as autoridades do país a expandirem a base monetária em um ritmo quase acelerado. Com o crescimento da base monetária, o peso argentino se deprecia constantemente, gerando uma inflação galopante.
Para se ter uma noção da situação econômica do país, a dívida externa da Argentina totalizou US$ 276,2 bilhões no segundo trimestre deste ano, enquanto as reservas internacionais do país somam US$ 26,2 bilhões, o que equivale a menos de 10% do valor da dívida.
Diante da incerteza fiscal e do medo da inflação, a população argentina vê no dólar uma forma de proteger seu patrimônio, enquanto não confiam no peso para nada além de compras cotidianas, uma vez que a moeda se deprecia rapidamente. Com uma demanda cada vez maior por dólares, a moeda argentina tende a se desvalorizar cada vez mais, como tem acontecido nos últimos anos.
Esse é um breve resumo dos motivos pelos quais o dólar atualmente é negociado a 1 mil pesos argentinos, sendo que há 10 anos o mesmo dólar valia cerca de 10 pesos argentinos.