História de Valor #008: A energia criativa de Marfa e outras cidades que respiram arte

Prada Marfa. Instalação artística permanente concebida de forma provocativa para se deteriorar naturalmente com o tempo no deserto de Chihuahua, a 60 km de Marfa, dos artistas Elmgreen & Dragset. Reprodução: pradagroup.com
Como uma remota cidade no sul dos EUA, em um estado majoritariamente voltado para o agronegócio como o Texas, se transformou em ponto turístico para os interessados em arte?
Foi no início dos anos 1970 que Donald Judd, artista plástico americano considerado o pai do minimalismo – apesar de não gostar do termo minimalismo para definir sua arte porque “afinal, o que é mínimo na arte?” JUDD, Donald. –, adquiriu um rancho e outros edifícios na cidade e em seus arredores com o intuito de preservar essas construções (que incluíam quartéis, hangares e o ginásio de uma base militar abandonada usada durante as duas grandes guerras mundiais, o Fort DA Russell), pois acreditava que a arte não deveria ser exposta em museus e vistas apenas por um breve período durante suas exibições, mas sim deveriam pertencer a um lugar permanentemente.
Por esse motivo, Judd adquiriu também um prédio inteiro de ferro fundido em Nova Iorque como forma de preservação da arquitetura e lá funcionavam seu ateliê, uma espécie de galeria de exposição e a casa de sua família. Mas foi em Marfa onde ele encontrou o necessário para realizar seu grande desejo: espaço suficiente, luz natural e poucas pessoas para atrapalhar a conexão da arte com o ambiente externo, fazendo com que ela fosse contemplada como parte do cenário e não transformada em um produto do showbiz.

Apesar de ser o responsável por começar esse movimento artístico na pequena cidade de apenas 1.750 habitantes, as obras de Judd não são as únicas que lá residem hoje em dia. Ainda nos anos 1970, ele passou a incentivar amigos a levarem sua arte e pode-se considerar este o início da Chinati Foundation: museu de arte contemporânea composto por 8 pavilhões integrados ao deserto que administra obras de diversos artistas¹ e dá ênfase aos trabalhos onde a arte e a paisagem ao seu redor estão inextricavelmente² ligados.

Tal concentração de arte trouxe uma grande energia criativa para a cidade texana que se tornou ponto de estudo e inspiração para as gerações atuais, tanto de turistas quanto de nativos que, antes acostumados a migrarem para os grandes centros, agora têm permanecido por lá, onde tudo é esteticamente diferente, desenvolvendo seus dons artísticos, principalmente música e artes plásticas.
Em Marfa, a arte dominou a cidade e não o contrário.

Enquanto você vive a cidade, a arte aparece quase como em um filme. Mas as obras outdoor não são algo exclusivo desse lugar escondido. Espaços como o Instituto Inhotim, em Minas Gerais (Brasil) e o Château La Coste, em Provença (França), são apenas dois exemplos de locais especializados neste tipo de experiência que contam com obras de grandes artistas como Tunga, Hélio Oiticica, Adriana Varejão (Inhotim) e o japonês Tadao Ando e o brasileiro Oscar Niemeyer (Château La Coste).

Porém, quando se anda com os olhos e a alma abertos para perceber e receber tudo o que existe à nossa volta, é possível consumir arte até andando na rua quando se menos espera. Artistas como Richard Serra (americano) e Ascânio MMM (português que reside no Brasil há décadas) são referências do que podemos encontrar andando por São Paulo e outras cidades brasileiras, por exemplo.
Se você quiser se aprofundar sobre toda a história, influência e importância de Marfa e como ela se tornou uma das maiores instalações permanentes de arte contemporânea do mundo, recomendamos:
Marfa Texas (1998) – curta-metragem sobre o trabalho de Donald Judd
Geografia da Arte, episódio 1 – Donald Judd e Marfa
Já para saber mais sobre Inhotim, Château La Coste, Richard Serra e Ascânio MMM, é possível navegar por aqui:
Château La Coste em Provenca: um paraíso de arte e arquitetura
¹como Dan Flavin, outro nome forte quando falamos de Marfa.
²que não se pode dissociar; constituído de elementos entrelaçados, entrecruzados a ponto de não se poder reconhecê-los separadamente.