História de Valor #003: a história dos bancos desde os Templários até a Revolução Industrial
A origem dos bancos foi um importante passo na evolução das relações comerciais, criando possibilidades antes inimagináveis e contribuindo para um crescimento econômico nunca antes visto. Contudo, as sociedades humanas percorreram um longo caminho entre o surgimento do dinheiro, por volta do século VII antes de Cristo, e a criação dos primeiros bancos, muitos séculos mais tarde.
Para compreender a origem dos bancos, é preciso entender os mecanismos que a sociedade adotou ao longo desse intervalo milenar que culminariam com o surgimento de grandes instituições financeiras que se tornariam um dos pilares da sociedade industrial.
Penhor: o precursor dos empréstimos
O penhor é a prática de entregar um bem móvel ou imóvel como garantia de pagamento por alguma operação. Registros de transações desse tipo foram encontrados na China, datando de mais de dois mil anos atrás. Não tardou para que a prática fosse adotada pelos gregos e, em seguida, pelos romanos.
Na prática, um indivíduo que precisasse de dinheiro poderia entregar um bem de valor, como uma joia, um artefato ou uma peça de roupa, como forma de garantia pelo pagamento da quantia emprestada. Caso o devedor não pagasse o que devia, o credor ficaria com o objeto em questão como compensação.
Contudo, ao longo da Idade Média (476-1453), a usura, prática de receber um excedente em dinheiro ou produtos em troca de um empréstimo, passou a ser condenada pela Igreja Católica e proibida para os cristão, o que limitou o desenvolvimento dessas transações. Por outro lado, isso criou uma oportunidade de negócios para os povos que não estavam sujeitos à autoridade papal, e alguns comerciantes judeus passaram a exercer essa atividade.
Os templários e seu sistema bancário primitivo
A Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, mais conhecida como Ordem dos Templários, foi fundada em 1118 pelo fidalgo francês Hugo de Payens com o intuito de proteger os cristãos que realizavam a peregrinação da Europa para Jerusalém, que havia sido conquistada pelos cristãos durante a Primeira Cruzada (1096-1099). Como é de se imaginar, essa viagem não era nada fácil, e muitos perigos ameaçavam os peregrinos.
Partindo de Roma, na Itália, por exemplo, o caminho até Jerusalém por terra se estendia por mais de 4 mil quilômetros, e não era fácil transportar grandes quantias por essa rota, tanto devido ao peso quanto ao risco de chamar a atenção de grupos de ladrões.
Pensando nisso, os Templários instituíram um sistema de cartas de crédito, que permitia que os peregrinos depositassem seu dinheiro na Temple Church, em Londres, e sacassem a mesma quantia em Jerusalém apenas apresentando a carta.
Ao longo dos anos, a Ordem dos Templários cresceu em tamanho e influência, e, embora os cavaleiros fizessem um voto de pobreza ao entrar para o grupo, a organização passou a acumular terras e riquezas, chegando a conceder empréstimos a nobres e reis, com destaque para Filipe IV, da França, que mais tarde daria início a uma campanha de difamação e perseguição aos membros da Ordem.
Os primeiros bancos
Os bancos como conhecemos surgem na Europa no período de transição entre a Baixa Idade Média e o início da Idade Moderna. A Casa di San Giorgio, criada na cidade de Gênova, no Norte da Itália, é considerada a primeira instituição financeira moderna da história, tendo sido fundada em 1406.
Gênova era um importante centro comercial na época, e estava em guerra com a vizinha Veneza. Dessa forma, a Coroa e importantes nobres e comerciantes genoveses investiram na criação da Casa di San Giorgio para, inicialmente, administrar as dívidas públicas, contraídas principalmente em virtude do conflito. Além da administração das dívidas, a Casa recebeu ainda o direito de realizar depósitos e atividades relacionadas ao crédito, marcando um ponto crucial para o início das atividades bancárias modernas.
Após passar por uma série de crises, a Casa di San Giorgio elaborou o Statuto de 1568, que introduziu alguns princípios básicos de administração financeira que influenciariam outras instituições posteriores.
Os bancos e as Revoluções Industriais
No século XVIII, a economia europeia ainda era baseada no mercantilismo, conjunto de práticas econômicas que visavam o enriquecimento do Estado e da Coroa pela exploração de recursos naturais e do comércio ultramarino de produtos com o objetivo de assegurar uma balança comercial positiva.
Esse cenário começa a mudar a partir de meados dos anos 1760, quando tem início, na Inglaterra, o movimento que posteriormente recebeu o nome de Primeira Revolução Industrial. Resumidamente, a Inglaterra se destacava pela produção têxtil, e o período entre as décadas de 1760 e 1860 foi marcado pela introdução gradual de novas tecnologias que revolucionaram não apenas o modo de produção, mas toda a organização social e econômica das sociedades europeias.
A primeira dessas tecnologias a ganhar destaque foi a máquina de fiação, a segunda foi o tear mecânico, e a última – e talvez a mais revolucionária – foi o motor a vapor, que passou a ser empregado no transporte, tanto em trens quanto em barcos, e em fábricas e minas.
A partir dessa nova realidade, há um salto na produtividade das fábricas urbanas e a sociedade industrial vai pouco a pouco se consolidando e se expandindo para além das fronteiras europeias. É nesse momento em que as instituições financeiras ganham uma nova função: suprir a demanda por crédito que surgia tanto entre os industriais, que precisavam de capital para expandir seus negócios de forma acelerada, quanto entre os consumidores, que passaram a contrair empréstimos com a finalidade de consumir os novos bens que eram produzidos pela indústria crescente.
Dessa forma, os bancos atendiam às demandas da sociedade industrial nas duas pontas, viabilizando aumentos simultâneos em proporções antes inimagináveis da produção e do consumo. Com isso, surgem diversas soluções em crédito, inicialmente direcionadas para uma minoria mais abastada, mas que pouco a pouco foram se tornando parte do cotidiano dos cidadãos comuns, conforme a mão de obra passou a ocupar também o papel de mercado consumidor dos bens produzidos pela indústria.
Para garantir o funcionamento desse sistema, são constituídos os primeiros bancos centrais, instituições que passaram a atuar oferecendo liquidez aos bancos e regulamentando o mercado de crédito, visando coibir práticas irresponsáveis e trazer mais segurança aos clientes e investidores.
Fontes:
Liana dos Santos Gonçalves de Souza e Luiz Eduardo Simões de Souza: História Econômica & História de Empresas vol. 23 no 2